sexta-feira, 27 de agosto de 2010

Palavras de um Nobre Baixista

Crisálide

Você é aquela de cujas palavras nunca hei de duvidar;
a quem meu orgulho sempre se há de curvar.
E enquanto queima lá fora o mundo impiedoso,
cá há este peito que te oferece conforto.

Quando poesia e romance tombam derradeiros,
permanece de pé desnudo apenas o amor verdadeiro.
Os badalos anunciam, em dobres de luto, sepulto prematuro.
Jáz, inerte, genuíno amor puro; o primeiro e único.

Autor: Jorge Marraus

domingo, 1 de agosto de 2010

Crônicas de um constrangimento

Baseado em fatos reais.

Finalmente, o celular, dois chips. A nega precisa de um novo. Dois chips. Esperei pra hoje. Vai ser surpresa. A Nega vai gostar, ela merece, pensa ele.

- Oi, Bom Dia!
 - Bom dia senhor, é o que?
 - Gostaria de fazer um cartão daqui.
 - Venha, venha! É aqui mesmo, sente-se!

Ele se senta, firme para começar o processo e comprar o celular...em 3, não 4 prestações acha que dá.

- Documentos, senhor?
- Sim, aqui.
- Senhor...Augusto...tudo bem?

(Será que no treinamento elas são  condicionadas a perguntar tudo bem só depois que se sabe o nome?- ele se indaga por dois segundos, mas responde)
- Tudo bem sim, e com você...- olha no crachá dela- Ga- bri-ela...Gabriela, tudo bem?
- Sim tudo. - ela responde sem o olhar nos olhos.

- Trouxe o contra-cheque Sr. Augusto.
- Sim, aqui está.
- Ok...ok...casado?
- "Amigado com fé casado é", eh eh! - ela não ri do trocadilho e ele, sério completa - Moro junto.
- Ok...ok... alguma dependente pro cartão?
- Minha esposa, claro (pensando bem ele acha que deve ter muitos homens que não dizem "claro" neste caso).
Ele fica vendo a cara da nega recebendo o presente fora da data. Feliz. Talvez eles até comemorem. Ela gosta de presente. Um Motel. Faz tempo que eles não vão há um motel. Ele não se sente mal em pensar no motel, mas logo esquece, porque só pensa na compra do celular. Dois chips. A Nega merece.

Ela pega o nome e todas as coisas necessárias.
Rg, Cpf, comprovante de residência, boleto do cartão do banco - aonde consta o pagamento em dia sem atrazos- o nome limpo no SPC/ SERASA, o nome da esposa os três últimos contra cheques da empresa, carteira de trabalho comprovando com o contra cheque que ele já está há um ano e meio.

- Que dia o senhor quer para a fatura do cartão?
- Dia 10, pode ser?
Ela já mais simpática, o olha no olho e sorri dizendo - Só dias ímpares, Sr. Augusto!
- Dia 11 então!
- Ah! Sim! Dia 9 e 11 não fazem mais parte.

Ela está me gozando, ou me cantando?- ele pensa- mas responde- Dia 15 então.
- O senhor pretende fazer compras hoje?
- Pretendo sim...
Ela lhe mostra os dentes e o interrompe, falando bem perto - Então, escolha dia 17 que aí a fatura só vem pro outro mês.

Outro mês é bacana. Agrada ele. Sobra uma graninha pra comemorar com a nega. Talvez ir no cinema. Nossa, quanto tempo sem cinema. Ele se lembra que tem uma sala barata agora na cidade. Mas só pensa no celular. Dois Chips. A Nega merece.

- Tá bom, pode ser sim.

Dois minutos em silênio. Ele pensando no celular e na Nega e em mais nada,e então, a expressão da moça a sua frente muda totalmente , voltando para a apatia do começo.

- Senhor Augusto, seu cadastro não foi aprovado.
- Como assim, não foi aprovado?
- Não sei senhor, é uma coisa externa, não temos acesso.
- Coisa externa? Mas moça, não estou devendo nada, pago tudo em dia, como assim?
- Senhor a aprovação é na central e não temos acesso.
- Mas moça... Gabriela, que critério a central usa?
- Senhor - ela já não o chama mais pelo nome - não temos acesso.
- Mas repare...quer dizer que a empresa sabe mais da minha vida do que eu?
- Olha senhor, entendo que está triste, mas como lhe falei, não tenho acesso.

Ele não sabe o significado e o peso do que disse, de certa forma nem sabe por que disse, mas disse, sério, com raiva, olhando nos olhos dela.

- Moça, preste atenção, você aqui, não tem acesso a nada. Nem a sua vida.

Ele sai andando, muito puto. Não vai ter celular, não vai ter os olhos da Nega brilhando, Não. Ele pega seu celular velho. Um chip. Que nunca o deixou na mão. E liga.

- Nega, tá de boa?
- To Nego, diga aí!
- Bota tua roupa mais bonita nega, vem pro shopping, bora vê um filme e depois ter uma noite daquelas. Com Motel e tudo! Você merece. 
- Nego, mas o mês tá só começando? Vai gastar assim?
- Nega, eles falam que não tenho acesso mesmo, mas eu faço nosso acesso!
- É o que, Nego? Tá falando o que, rapaiz?
- Esquece Nega, só se arruma e vem!
- Ai, Nego, só você mesmo!


autor: Cícero Dias.